Vermelhou no Curral… Eu quero é Tic, Tic, Tac
Compartilhe esse conteúdo
Uma crônica sobre um Loop Infinito do Boi Garantido/ Foto: Divulgação
POR ANDRÉ VAZ
Mais um Festival de Parintins se findou, e nos parece que ouvimos a mesma vitrola velha tocando a pelo menos umas 3 edições no lado vermelho da força. Há algo que sempre me deixa com um misto de perplexidade e indignação: a obsessão do Garantido em martelar incessantemente as toadas “Vermelho” e “Tic Tic Tac”.
Um momento especial esperado na apresentação do Boi Caprichoso é o que ele trará à sua chegada: uma trilha de abertura misturando grandes clássicos, um texto rebuscado proferido em perfeita dicção pela voz do apresentador, todo o elenco de composição invadindo a arena de azul, a galera explodindo de emoção flamulando as bandeiras, a curiosidade em saber como será o balé aéreo deste ano. É isso que se espera do lado azul.
Porém, do lado encarnado, já são três anos seguidos em que se sabe de antemão o que acontecerá: o apresentador entra com a arena vazia, um teclado melancólico entoando a toada “Vermelho”.
Neste ano, até o próprio Braulino Lima, aos seus gloriosos 85 anos, foi levado à arena para provar ao mundo que “Tic Tic Tac” é propriedade incontestável do Boi Garantido. Imagine a cena: um Braulino debilitado, sendo exibido como um troféu vivo da eternidade da toada, enquanto lágrimas de nostalgia escorrem dos olhos dos espectadores, muitos dos quais provavelmente nem eram nascidos quando a música era um verdadeiro sucesso.
Os compositores novatos se perguntam se devem começar a compor toadas para as próximas décadas ou apenas desenterrar velharias do baú da vovó. Porque, afinal, quem precisa de inovação quando se pode reciclar a mesma batida antiga e ainda ganhar pontos por “tradição”?
Ah, Parintins, terra de boas toadas e grandes espetáculos, onde até o impossível se torna possível quando se trata de garantir a vitória a qualquer custo.
A cada ano, como se fosse um déjà vu cruel e interminável, lá vem o Garantido com sua estratégia infalível de empurrar “Vermelho” e “Tic Tic Tac” goela abaixo dos jurados e do público. Não que eu desmereça a história por trás de cada uma dessas toadas, mas qual é a graça de assistir a um show que parece ter um botão com o modo Repeat ativado?
Enquanto o Caprichoso se esforça para inovar, explorando novos ritmos, temas e arranjos, o Garantido está preso num loop infinito de seus hits noventistas que ressucitam a cada festival. Tentando persuadir os jurados com um truque manjado apelando para a nostalgia fácil e conquistar uns pontinhos a mais em detrimento de tudo o mais que deixa de apresentar.
O pior é que funciona. Sabe aquele modulo alegórico que despencou na frente do jurado e levou nota 10, é porque ele foi sucedido por “a cor do meu batuque tem o toque tem o som da minha voooooz”. A cada “Vermelhou no curral” entoado pela enésima vez, se vê os jurados balançando a cabeça como se estivessem hipnotizados pela familiaridade da canção. É como se o Garantido estivesse dizendo: “Vejam só, nós temos hits mundiais! Não podemos perder!” Que bom que não tem dado certo.
Mas talvez essa seja a essência do Garantido: segurança em vez de risco, familiaridade em vez de surpresa. E quem somos nós para julgar? Afinal, se tem algo que o Garantido sabe fazer bem é jogar com as cartas que já estão marcadas.
Aqui fala um torcedor do Caprichoso, mas acima de tudo, um amante apaixonado da nossa cultura e do Festival de Parintins. Até quando seremos obrigados a testemunhar essa ladainha de “tradição” sendo usada como cortina de fumaça para encobrir a falta de cuidado, a falta de dedicação genuína, a preocupação com a apresentação e a mensagem que o festival transmite?
Então, enquanto os tambores ecoam e os bumbás dançam, continuaremos aqui, torcendo para que um dia o júri perceba que há mais na tradição do que repetir “Tic Tic Tac” e “Vermelho” até a última gota de suor do boi.
André Vaz JORNALISTA
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Manaus Digital
Publicar comentário